quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Redes sociais foram o combustível para as revoluções no mundo árabe. Segundo estudo, manifestantes disseminaram e fortaleceram revoltas via Twitter e Facebook



A propagação do movimento conhecido como Primavera Árabe, que completa um ano nesta quarta-feira (04/01), para toda a região do Norte da África e do Oriente Médio não seria teria sido possível sem os recursos e dispositivos proporcionados pelas redes sociais. A conclusão foi tirada de um relatório divulgado pela Dubai School of Government, que indica a importância de serviços como Twitter e Facebook na disseminação e fortalecimento das manifestações populares que, em última instância, se espalharam pelo mundo.

Na Tunísia, ponto de partida da série de revoltas, o número de usuários cadastrados no Facebook aumentou consideravelmente em um período de apenas dois meses: 200 mil novos  cadastrados entre novembro de 2010 e janeiro de 2011, segundo o estudo.

Foi justamente nessa época que os tunisianos foram às ruas para exigir a queda do presidente Zine el Abidine Ben Ali, que estava no poder há 23 anos. A força do Twitter no país também é evidenciada pelos números do relatório. No dia 14 de janeiro, data em que Ben Ali renunciou e fugiu para a Arábia Saudita, a rede de microblogs teve seu pico de acessos por tunisianos.


Mulheres sírias participam de manifestação contra o governo de Bashar al Assad

A partir do aumento do número de usuários e acessos às redes sociais, começaram a surgir pessoas que se destacavam das demais por conta da frequência com que postavam suas mensagens e pela forma com que descreviam o que acontecia nos protestos.

Sultan al Qassemi é um deles. O analista político dos Emirados Árabes Unidos postou sua primeira mensagem relacionada à Primavera Árabe no início de janeiro, chamando a atenção para a morte do tunisiano Mohamed Bouazizi, vendedor de verduras que cometeu suicídio depois de revoltar-se com a com o tratamento dado pelo governo a ele e a toda a população tunisiana.

Al Qassemi narrou a revolução tunisiana, mas não parou com a saída de Ben Ali. Como seus posts passaram a ser largamente utilizado por veículos de comunicação ocidentais, o analista político começou a divulgar também o que acontecia no Egito.

Atualmente, Al Qassemi é seguido por mais de 88 mil pessoas. Em janeiro, quando os protestos começaram, seu perfil era seguido por apenas 7 mil pessoas. O crescimento vertiginoso fez com que ele fosse eleito um dos tuíteiros mais influentes do mundo, pela revista norte-americana Time. Durante os protestos no Egito, Al Qassemi passou a postar um comentário na rede a cada 45 segundos, em média.

De acordo com o relatório da Dubai School of Government, nove em cada dez tunisianos e egípcios afirmaram ter usado o Facebook para organizar os protestos e aumentar a participação da população nas manifestações.

Nos outros países em que a Primavera Árabe se fez presente, as redes sociais também mostraram sua força e ajudaram na organização dos protestos. O número de usuários do Facebook no mundo árabe cresceu de 14,8 milhões para 27,7 milhões no período de um ano, entre fevereiro de 2010 e 2011, também de acordo com o documento.

Hashtags da revolução

Durante os protestos do mundo árabe, o Twitter foi amplamente utilizado para que muitos países ocidentais fossem informados a respeito do que acontecia nos países. Isso porque o acesso da imprensa internacional a alguns desses locais era muito restrito.

De certa forma, este cenário fez com que a cobertura e a repercussão da revolução não ficasse restrita aos países da região. O ranking dos assuntos mais comentados durante este ano no Twitter evidencia o fato de que, em muitas nações, os manifestantes encontraram brechas para utilizar o serviço e disseminar informações sobre os protestos.

A hashtag #Egypt (Egito, em inglês) foi a mais utilizada durante este ano. Apenas nos três primeiros meses da revolução egípcia, o termo foi utilizado durantes 1,4 milhões de vezes. Em 10º lugar ficou a hashtag #Jan25, data que marca o início dos protestos no Egito contra o presidente Hosni Mubarak, que deixou o poder em 11 de fevereiro. O termo foi utilizado 1,2 milhão de vezes no Twitter, também nos primeiros meses da revolta.

Outros termos largamente utilizados no Twitter foram #Bahrain; #protest; #Yemen; #arabspring; #ghaddafi e #libya, sendo que os dois primeiros apareceram em 640 mil e 620 “tuítes”, respectivamente.

Uso por profissionais

O uso das redes sociais nas revoltas árabes não ficou restrito apenas à população, geralmente mais jovem, que ia às ruas. Alguns jornalistas que faziam oposição ao regime dos líderes árabes passaram a utilizar as ferramentas com mais frequência e força.


A jornalista Mona Eltahawy discursa em um fórum sobre democracia, após ter tido papel importante na Primavera Árabe

Um exemplo deste uso considerado profissional das redes sociais é a jornalista egípcia Mona Eltahawy. Em seu perfil no Twitter, Mona passou a narrar o que acontecia no Egito.

A jornalista participou ativamente dos confrontos entre manifestantes e forças nacionais na Praça Tahrir. A atividade de Mona não cessou, no entanto, com o passar dos meses.

No dia 24 de novembro, também por meio de sua conta na rede de microblogs, a jornalista denunciou que havia sofrido espancamento e abusos sexuais por parte da polícia.

Mona foi detida na própria Praça Tahrir e levada ao Ministério do Interior, onde ficou detida por 12 horas. Nesse tempo, a jornalista teve seu braço esquerdo e sua mão direita quebrados.

"Estou livre. Além de baterem em mim, os 'cachorros da CSF' [Força de Segurança Central] me sujeitaram ao pior abuso sexual. Cinco ou seis me cercaram, apertaram meus seios, pegaram na minha área genital e eu perdi a conta de quantas mãos tentaram entrar nas minhas calças. Eles são cachorros e seus chefes são cachorros. F******, polícia egípcia", escreveu a jornalista indignada.

Apesar da violência, Mona se recuperou e continuou a usar sua conta no Twitter para contar o que acontecia no país. Seus relatos tornaram-se ainda mais relevantes quando parte da população egípcia voltou às ruas nas últimas semanas para exigir que a Junta Militar entregasse o poder a um governo civil. Atualmente, a jornalista é seguida por mais de 100 mil pessoas em seu perfil.

Proibição

Por conta do crescente uso das redes sociais pelos árabes nos países em revolução, muitos governos intensificaram o bloqueio e as restrições às ferramentas para que evitar que as revoltas se fortaleçam.

Na Síria, por exemplo, onde o presidente Bashar al Assad sofre grande pressão para renunciar, o governo proíbe o uso das redes sociais e a entrada de jornalistas internacionais.

Apesar disso, os manifestantes encontraram novamente brechas para que, por meio de celulares, enviassem vídeos para fora do país com imagens dos conflitos. As imagens no Youtube, e os textos do Twitter e Facebook representam uma forte resistência aos governos desses países. Em uma revolução que não tem previsão para terminar, conectar os manifestantes parece essencial.




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